Técnica de imagem acessível pode prever riscos cardíacos em pacientes com doença de Chagas
Crédito: Unsplash/CC0 Domínio Público
Um simples exame de imagem capaz de avaliar a deformação miocárdica durante a contração surgiu como uma ferramenta promissora para prever o risco de complicações cardíacas em pacientes com doença de Chagas crônica.
O estudo, realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto em parceria com pesquisadores da Duke University e de Yale (ambas nos Estados Unidos), destaca o índice global de strain longitudinal (GLS), já utilizado em outras doenças e condições, como um marcador sensível e independente para prever desfechos na cardiomiopatia chagásica crônica.
Os resultados são publicado no diário PLOS Doenças Tropicais Negligenciadas.
A cardiomiopatia chagásica crônica é uma das principais consequências da doença de Chagas crônica. Causada pelo parasita Trypanosoma cruzi, a doença danifica o tecido cardíaco ao longo do tempo, resultando em inflamação, cicatrizes (fibrose) e insuficiência cardíaca. Mesmo após a fase aguda, a infecção pode progredir silenciosamente durante décadas, podendo eventualmente causar complicações graves, como arritmia, embolia e morte súbita.
A técnica de deformação é um método de ecocardiografia avançado que mede o SLG rastreando pontos brilhantes em imagens cardíacas (speckle tracking). Este índice pode identificar se o miocárdio está se deformando adequadamente durante a sístole (contração), o que é um sinal crucial de dano ao tecido cardíaco, mesmo antes da fibrose se tornar evidente.
“Quando o miocárdio não está se deformando adequadamente, isso sugere fibrose no tecido. Portanto, embora o GLS não visualize diretamente a fibrose no tecido cardíaco, ele prevê sua presença entre as células musculares do coração (miócitos), o que sinaliza um alto risco de complicações futuras”, explica Minna Moreira Dias Romano, professora da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP.
No estudo foram analisados exames ecocardiográficos de 77 pacientes com doença de Chagas crônica. Os pacientes foram acompanhados por aproximadamente três anos. Os pacientes foram divididos em três grupos com base nos valores do SLG, e os desfechos avaliados incluíram morte, hospitalizações, taquicardia ventricular sustentada, novos casos de insuficiência cardíaca e eventos cardioembólicos.
Os resultados mostraram que pacientes com SLG igual ou superior a -13,8% (indicando maior comprometimento) tiveram pior prognóstico, com maior incidência de óbito e complicações. Mesmo após ajuste para idade, sexo e fração de ejeção do ventrículo esquerdo (a porcentagem de sangue bombeado pelo ventrículo esquerdo a cada batimento), os pesquisadores descobriram que o SLG permaneceu um preditor independente de risco estatisticamente significativo.
“Essa técnica já é utilizada em diversas outras cardiopatias, como em pacientes oncológicos para monitorar danos ao coração causados pela quimioterapia, como nos casos de câncer de mama. Agora, o estudo sugere que o mesmo método pode ser aplicado para acompanhar a progressão da doença de Chagas, principalmente em locais onde o diagnóstico é raro, como em regiões geográficas com baixa prevalência da doença”, explicou o pesquisador.
Romano ressalta que estudos anteriores validaram outros índices para detecção precoce de complicações cardíacas decorrentes da doença de Chagas, mas ainda não comprovaram o papel do GLS como prognosticador independente.
Um dos métodos validados para prever o risco de doença cardíaca crônica causada pela doença de Chagas é o escore de Rassi. Desenvolvido por pesquisador brasileiro, o escore avalia seis variáveis para prever o prognóstico em longo prazo de pacientes com doença de Chagas.
“Já foi validado, mas ainda deixa margem de risco entre os casos intermediários, ou seja, aqueles que não são classificados como de alto ou baixo risco”, diz Romano.
O método mais preciso para detectar fibrose miocárdica é a ressonância magnética cardíaca com contraste (gadolínio). No entanto, este teste caro não está amplamente disponível e pode causar desconforto ao paciente, como claustrofobia.
Por outro lado, a ecocardiografia com GLS é mais barata, pode ser repetida quantas vezes forem necessárias e pode ser aplicada em larga escala. “É um marcador de risco que pode ser amplamente aplicado, principalmente em locais onde o diagnóstico de cardiopatia chagásica ainda é raro”, enfatiza Romano.
Apesar das boas notícias, ainda existem desafios para a implementação do GLS em larga escala. Embora a técnica seja acessível, requer conhecimento técnico e interpretação especializada.
“A técnica é mais complexa que os exames laboratoriais convencionais, como os ensaios bioquímicos. Mesmo assim, representa um avanço significativo na estratificação de risco e no monitoramento da progressão da cardiomiopatia chagásica crônica, oferecendo aos profissionais de saúde uma ferramenta poderosa para a tomada de decisões clínicas mais precisas”, conclui Romano.
Mais informações:
Minna Moreira Dias Romano et al, Strain longitudinal global como preditor de desfechos na cardiomiopatia chagásica crônica, PLOS Doenças Tropicais Negligenciadas (2025). DOI: 10.1371/journal.pntd.0012941
Citação: Técnica de imagem acessível pode prever riscos cardíacos em pacientes com doença de Chagas (2025, 4 de novembro) recuperado em 5 de novembro de 2025 em
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